ALPINISTA CEGO ESCALA O EVERESTE
11/09/2014 por MarciaAlpinista Cego Escala o Everest (Revista Time -- Traduzido por Márcia Clayton)
Assim que escorregou em uma avalanche, Erik começou a especular qual seria a sua sorte. Por um momento, todos aqueles clichês sobre o que as pessoas cegas deveriam fazer -- tornarem-se afinadores de piano ou vendedores de lápis -- passaram pela sua cabeça, e ele achou que estes estereótipos tinham razão de existir. Pessoas cegas, certamente, não deveriam estar ali, vagueando sobre campos de gelo que estão sempre se movendo, medindo distâncias de mais de 300 m de profundidade em fendas de geleiras com bastões (de esqui), e pulando literalmente "sobre" e "no" desconhecido. Erik Weihenmayer, 33 anos, não é somente um outro alpinista que teve alguns problemas em sua escalada no Himalaia. Cego desde os 13 anos de idade, vítima de uma doença rara na retina, começou a escalar quando tinha 20 anos. Os cegos estão acostumados com padrões. Aprendem a identificá-los em seu ambiente, e a confiar neles em seu caminho pelo mundo. Numa avalanche não há sistema, repetição ou ritmo nas camadas de terra congelada. Mas Erik possui em abundância uma qualidade indispensável em qualquer grande montanhês: resistência mental, ou seja, a habilidade para agüentar uma quantidade considerável de desconforto, frio, dores físicas, tédio, insônia, comida e conversa ruins. Quase 90 por cento daqueles que almejam chegar ao topo do Everest, fracassam. Muitos, pelo menos 165 desde 1953, nunca retornaram aos seus lares e seus corpos permanecem em lugares onde caíram. Para Erik, a chave da sobrevivência foi a aceitação, não transcendê-la, mas entendê-la profundamente de maneira a encontrar capacidade para superá-la. Depois de ter escalado o Kilimanjaro na África e o Aconcagua na Argentina, entre outros picos, Erik acreditava que o Everest seria impossível. Escalar com Erik requer um sino na mochila para que ele siga o som e prossiga sem bastões especiais ao longo da trilha. Seus companheiros o alertam diante dos perigos. Ele é rápido, e muitas vezes mais ligeiro que alpinistas experientes. Para a grande empreitada, foi montado um time que reunia alpinistas veteranos do Everest, amigos confiáveis de Erik. Para ele, que já tinha numerosos patrocinadores de roupas e aparelhagens, este era o grande desafio de sua vida. Se fracassasse, estaria desapontando não só a si próprio, mas a todos os cegos, confirmando a teoria de que certas atividades são estritamente para as pessoas de visão normal. Ironicamente Erik levou alguma vantagem sobre os demais, assim que começou a se aproximar do topo. Naquela altitude, todos os alpinistas tinham que usar máscaras de oxigênio e óculos escuros especiais, restringindo a visão tão severamente, que não conseguiam ver, sequer, seus próprios pés, uma condição a que Erik já está bastante habituado. A escalada final iniciou-se ao cair da tarde, o que acarretou uma subida acompanhada de escuridão total, sendo que a única iluminação provinha das lanternas de mineiros usadas na testa. Com uma caída vertical de 3.000 m adentrando o Tibete, de um lado, e 2.100 m em direção ao Nepal, do outro, o "South Summit" (Pico Sul) a 8.765 m, com ventos que podem exceder a 160 km por hora, obriga muitos alpinistas, a contragosto, darem a volta e desistirem. Graças a uma mudança no tempo para melhor, a expedição de Erik chegou ao "Hillary Step" (Degrau de Hillary), uma rocha de 12 m, que é o maior obstáculo antes de se chegar ao cume. Dali, subiram mais 45 minutos até o ponto mais alto. "Olhe em volta", disse um de seus companheiros a Erik, quando finalmente se encontraram no topo do mundo. É uma conquista única, prova de quanto o homem é capaz de ampliar os seus limites. Erik pode ser considerado o símbolo contemporâneo para os deficientes da visão. De volta à civilização, os únicos empecilhos na vida de Erik têm sido os "brinquedos novos" de sua filha de um ano, Emma. E Erik caçoa, afirmando: "em se tratando de obstáculos fatais, o Himalaia não representa nada em comparação com uma criança que engatinha."